27 de Outubro de 1971, tardinha ali estava Chimbila, uma
povoação, entre Henrique de Carvalho e cidade do Luso. Para se lá chegar –
felizmente para nós –, fazíamo-lo por estrada alcatroada, o que sempre nos
livrava das minas anti-carro.
Situada no leste de Angola, distrito da Lunda, que tinha uma
área geográfica de 167 786 Km2. A capital do distrito é Sáurio (nome que os
naturais de Angola davam a Henrique de Carvalho. Este distrito era dividido do
Moxico pelo rio Cassai, que nasce perto de Monhonga (?) atravessa as zonas de
Camanongue (Buçaco), Cassai, Luau (Teixeira de Sousa) inflectindo então para
norte e servindo de fronteira com a Republica Democrática do Congo, até ao
paralelo 7* 17" çat. S, continuando o seu percurso por terras congolesas
até confluir na margem esquerda do rio Zaire. Recebe como principais afluentes
o Chicapa, Luachimo, Chiumbe e Luembe. Numa extensão de 400Km.
Toda esta região tinha uma altura média de 1300m. e clima
tropical com chuvas no tempo quente (Outubro a Maio), insuficientes para a
agricultura.
Os naturais cultivavam principalmente mandioca, massango,
massambala, tabaco, milho feijão e amendoim. Caça e pesca fluvial Esta seria
para nós a zona de combate.
Tinha, sido antes da guerra eclodir, um lugar de comercio,
já que ainda lá se encontravam as casas dos colonos. Como seriam os tempos
naquele local? Quanta seria a sua população?
Não nos é possível sabe-lo.
Chimbila iria ser a nossa casa por largos, e penosos meses.
Não passava este (aquartelamento) de meia dúzia de quimbos,
muitos deles com o chão cimentado outros forrado a garrafas de cerveja,
enterradas com o fundo virado para cimas
A porcaria, era mais do que muita, por todo o lado se viam
galinhas pequenas hortas – talvez para matar saudades – e até suínos. Esta
malta, que vínhamos render, esteve aqui toda a sua comissão. Eram o que se
chama na gíria militar uns " baldas".
As, estórias que nos contavam a ser verdadeiras, – e porque
não – eram o sinal mais do que evidente de que esta guerra ia ser perdida. Os
soldados já não tinham o moral elevado e o sentido de patriotismo, era qualquer
coisa de difuso e vago.
Por se terem recusado ou disfarçado de fazerem as operações,
por não terem feito nada para dar um pouco de dignidade ao local, foram
castigados e estiveram toda a comissão nesta zona.
Quando partiram fizeram uma “farra” enorme, que foi bem
regada de cerveja e vinho.
Vê-los partir lembrou-nos que era chegada a nossa vez.
Depois de nos instalar-mos, e de se ter organizado a vida
neste rectângulo de terra batida, toda cercada por florestas – a cidade mais
próxima a antiga Luso ficava a mais de cem quilómetros – foi preocupação do
nosso então comandante de companhia capitão Azuil, proceder-se a limpeza e
reorganização do espaço.
Foram montadas, camaratas pré-fabricadas, e foi dada uma
cama, com colchão de espuma, lençóis e mantas. Um luxo para quem andou durante
alguns meses a dormir, sempre e precárias condições.
Aqui em Chimbila havia água quase sempre, porque os
velhinhos tinham montado uma bomba que muitas vezes recusava-se a trabalhar.
Valia-nos que perto corria o Cassai mais afastado um pequeno ribeiro de águas
límpidas e frescas. Era aqui que nos abastecíamos do líquido da vida e
tomava-mos os nossos deliciosos banhos, sempre vigiados talvez à distância por
elementos ditos de informação.
Havia também um alto depósito.
Não sofremos ataques nesta zona. Tinha sido celebrado um acordo
com Jonas Sabimbe, que deveria isso sim combater o MPLA, mas isso são outras
histórias que se contaram mais tarde.
Era assim esta guerra suja.
O nosso capitão Azuil, sempre nos foi dizendo que não
estávamos ali para acabar com a guerra mas, para cumprir o tempo da comissão.
Passou afazer parte da nossa actuação, a distribuição pelo
natal e noutras ocasiões de comida roupa e outras ofertas à população do Biula,
a que ficava mais próximo de nós.
No meio desta selva de sons, poder olhar a natureza, o azul
intenso do céu em toda a sua plenitude era para nós algo de reconfortante para
o espírito, o silêncio era apenas cortado pelo ronco do trabalhar dos motores
dos carros e de um ou outro helicóptero, em missão.
As «cucas» eram a animação da malta e os Furriéis
milicianos, faziam, jus ao espírito de estudante. Era cada camuéca de se
lhes tirar o chapéu.
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