24/05/12

Arroz de espinhas

Arroz de espinhas


Hoje vou partilhar com os meus queridos visitantes, mesmo aqueles que conviveram estes momentos, uma parte da minha estória pessoal, quando “comemoro” dentro de dias 37 anos sobre os acontecimentos.(Este escrito estava no blogue que encerrei)

Por certo alguns dos meus ex-camaradas já esqueceram outros irão recordar e aqueles que mais de perto tiveram conhecimento do caso sabem que é verdade.

Estávamos em pleno mês de Julho de 1972, em Chimbila.

Nesse dia o rancho – terceira refeição, ou melhor jantar – iria ser arroz de bacalhau.
Dá vontade hoje como nesse dia de rir só de lembrar que iríamos comer bacalhau, essa espécie rara e em vias de extinção, não sei se era o pescado o Oceano Atlântico – o chamado da Noruega se o do Oceano Pacífico –, mas também não é relevante para o caso em apreço. Certo é que nem no natal esse desgraçado caiu na mesa, tal era a raridade.

Como na altura desempenhava a função de cantineiro, e porque a respectiva cantina era paredes-meias com o “armazém” de géneros apercebi-me no dia antes de alguns movimentos a horas pouco convenientes para se estar nesse local.

O certo é que no prato o bacalhau … era velo.

Já sabíamos que iria acontecer, e como tal alertamos os camaradas para não se sentarem e nem comerem, até a chegada do “Tigre da Malásia” ou seja o capitão, comandante de companhia.

Este senhor, quando entrou no que se chamava refeitório, atirou uns bitaites para o ar e retirou-se.

Nunca tinha sido nossa intenção não comer. Essa seria uma grande estupidez, já, que pelo menos, o dito arroz de bacalhau, ao mesmo sabia.

Porque alguém, – que até aos dias de hoje nunca soube – foi qual bufo, cantar aos ouvidos do Tigre, este implacavelmente aplicou-me uma pena de prisão de 20 dias, aliás, o máximo que lhe era concebido pelas leis militares.

Teve azar. Nunca comemos e calamos, e nessa circunstância também não o fizemos e em boa hora.

Arriscando um pouco mais, expusemos ao Comando de sector o que tínhamos observado. Para os que passaram pelo Leste de Angola, deverá por certo apenas dizer que esse comandante, Passos de Esmeriz, mais conhecido entre os militares por: Asa Negra.

Foi lindo ver ao fim de 25 dias a cara do Tigre, quando me apresentei na companhia.
O que passou a correr de boca em boca é que eu tinha um grande padrinho. Mas, não tinha, foi a justiça do meu gesto reconhecida e disso se puderam queixar, tanto o Sargento responsável como o furriel vagomestre, que viram também a sua caderneta manchada, com o castigo.


A grande perda, que tive foi no meu pré já que com o castigo fui despromovido e consequentemente o mesmo foi reduzido, e assim lá deixaram menos umas “cucas” “de irem abaixo.
O tempo foi decorrendo, na sua marcha lenta, rumo ao fim de comissão.
O Tigre da Malásia reuniu com os oficiais e sargentos de carreira, para distribuírem alguns louvores, por aqueles que entendessem serem dignos dos mesmos.

Se desprestigio algum para os próprios, se uns foram bem entregues, outros pela justificação apresentada em ordem de serviço, não nos se apresentam ainda hoje justificados.

Ser louvado em campanha por ter servido bem à mesa os senhores oficiais, não será de todo uma justificação.

Como tínhamos sido punidos e muito mais foi sugerido o nosso nome para um louvor tanto mais, que tínhamos sido o autor do crachá e construtor do memorial aos camaradas tombados.

A reação do Tigre foi: NÃO.


Porque lemos a ordem de serviço, e nos sentimos injustiçados, correndo o risco de nova punição, passamos à acção, que é com quem diz gozar como dizia um … o meu grande prato.
Assim solicitamos ao cabo Cruz um Cabo-verdiano, – que desempenhava as funções de carpinteiro, e não foi louvado, não obstante acumular a função de operacional –, que nos construísse uma caixa de engraxar sapatos.

Pronta, fomos nos colocar a entrada da messe de oficiais, para dar “graxa” aos ditos a fim de conseguir o dito louvor.

O tigrezinho arreganhou os dentes – por sinal amarelos como o dos elefantes –, e nada disse.

Afinal tinha escapado e a justificação é que estava cacimbado.

Uma ova é que estava.

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